Tem um jogo de auditório em
que os competidores recebem uma foto 3x4 de uma pessoa
da platéia e precisam localizá-la o mais
rápido possível. Se um dia a produção
quiser tornar o jogo praticamente impossível,
é só recrutar uma platéia composta
inteiramente por japoneses: para o brasileiro padrão,
todos os japoneses parecem iguais.
Mas a dificuldade de diferenciar entre dois rostos com
olhos amendoados não é privilégio
tupiniquim. Na verdade, qualquer ocidental em viagem
ao Japão - ou cercado de turistas japoneses na
Torre Eiffel, por exemplo - provavelmente terá
dificuldades para encontrar um certo rosto japonês
na multidão. Será um problema genético,
onde cérebros com olhos redondos só identificam
olhos redondos e cérebros com olhos puxados só
identificam olhos puxados? Não: parece que é
uma questão de experiência.
Para reconhecer um rosto é preciso guardar uma
representação sua na memória, para
comparação com a versão ao vivo.
Em princípio, uma maneira de fazer isso seria
guardar uma versão neuronal da fotinho 3 x 4
para cada rosto conhecido. Reconhecer um rosto familiar,
então, seria simplesmente encontrar o "3
x 4 neuronal" correspondente na memória.
Só que pelo jeito não é assim
que identificamos um rosto, segundo um estudo realizado
no Instituto Max-Planck, na Alemanha. Se cada rosto
tivesse seu 3 x 4 na memória, reconhecê-lo
não deveria ser mais ou menos difícil
depois de ver outras pessoas. Só que, depois
de observar longamente um certo rosto desconhecido,
os nove voluntários do estudo mudaram drasticamente
sua opinião sobre a identidade de outros rostos
que haviam visto antes. Ou o "3 x 4 neuronal"
muda de nome quando outro rosto é visto, ou,
o que é mais provável, ele simplesmente
não existe.
Quer dizer: parece que existe, sim, um "3 x 4
neuronal" no cérebro. Só que, ao
invés de existir um para cada rosto conhecido,
o cérebro teria no bolso um único 3 x
4 neuronal: seria aquele que representa o "rosto
médio", ou "rosto-padrão",
resultado da média de todos os rostos conhecidos.
Para identificar novos rostos, bastaria compará-los
com esse rosto-padrão e mapear as diferenças.
O único porém é que o efeito encontrado
no estudo desaparece em menos de um segundo... Mesmo
assim, o estudo apóia a existência de um
"rosto-padrão", e indica que ele é
modificável pela experiência - como não
poderia deixar de ser, se esse 3 x 4 de fato representa
uma média dos rostos vistos, já que estamos
sempre vendo novos rostos.
São necessários mais experimentos, mas
dá para imaginar que vendo muitos rostos de um
certo tipo - com olhos redondos, ocidentais, por exemplo
- o padrão mudará naquela direção,
e ficará mais fácil identificar pequenas
variações ao redor daquele novo rosto-padrão.
Aliás, isso é provavelmente o que aconteceu
na fase de treino do estudo, enquanto os voluntários
aprendiam a identificar os rostos usados no teste, totalmente
criados por computador.
O problema é que enquanto um rosto muito distante
do rosto-padrão será rapidamente identificado
como "diferente", dois rostos muito distantes
do rosto-padrão, mas próximos entre si,
não serão diferenciados. Ou seja: o brasileiro
médio não precisa olhar duas vezes para
identificar um japonês na praia de Ipanema ou
na platéia do programa de auditório, mas
para saber se é o Kazuo Oshiguri que está
na foto ou seu primo Hiroto Kawasaki vai ser preciso
pedir o passaporte...
Fonte: http://www.cerebronosso.bio.br
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